Acho que há um mês atrás, a produtora do filme Praça Saens Peñaa me contou que um francês que havia assistido ao filme em um festival do Rio tinha adorado e estava louco para conhecer a Tijuca. Ela me falou que eles fizeram um “tour” pelo bairro com o gringo. Logo me bateu uma preocupação: o que eles vão mostrar pra ele?! A Tijuca não tem o pôr do Sol do Arpoador, nem o resto da orla e da sofisticação da Zona Sul com o seu jeito “carioca”, também não tem aquele charme histórico e artístico de Santa Teresa ou do Centro do Rio, nem a aparência clássica do subúrbio com casas simples e gente na rua, nem é uma favela com a estética popular da gambiarra e do funk e muito menos tem a modernidade americanizada da Barra da Tijuca (aliás alguém quer ver isso?!)
Na verdade a Tijuca tem um pouco de todos esses lugares (talvez não tenha praia…), mas não tem nada para francês ver, no máximo o Maracanã e a Floresta da Tijuca. Nem mesmo a Praça Saens Peña, título do filme, que foi destruída depois do metrô e que perdeu seu espaço de lazer, especialmente seus cinemas. E não sabia ao certo o que deveriam mostrar, sempre penso nisso quando tento justificar minha paixão pelo bairro para alguém de fora e nunca sei o que apresentar exatamente. Mas a Tijuca não é um ponto turístico (não que não possa ser), ela é um bairro de verdade, onde as pessoas vivem. E para entendê-la, a pessoa precisa morar aqui ou freqüentar constantemente a região. Encontrar todos os seus amigos caminhando pelo quarteirão (além do seu dentista, oftalmologista, cabeleireiro), ter o seu boteco de estimação, conhecer o dono da banca de jornal e saber que ele vai te avisar que chegou a sua revista preferida, entre outras coisas que são parte do sentimento de bairro.
Na Tijuca esse sentimento se mistura com o de estar em uma cidade do interior, onde todos se conhecem. (É incrível quando alguém da Zona Sul descobre que você mora na Tijuca e pergunta se você conhece algum amigo dele que mora no bairro, daí você reclama dizendo que a Tijuca é muito grande, blá, blá, blá… mas depois você pergunta o nome e não é que você conhece a pessoa!) É uma espécie de Viver a Vida, sem a futilidade e banalidade de uma dessas novelas lebloninas. Em uma crítica, li que o filme foi chamado de anti-Manoel Carlos, mas estranhamente, nesse ano o bairro aparece entre as locações da novela que antes eram exclusivamente o Leblon.
Voltando ao que interessa…
O filme consegue fazer isso. Representar a vida no bairro, rolando quase como no seu dia-a-dia, sem exageros, sem grandes dramas, bem diferente da Zona Norte de Nelson Rodrigues, outro grande tijucano. Os personagens parecem reais, eles poderiam sentar do seu lado em algum banco e puxar papo naturalmente. No filme os choques e conflitos tanto sociais, de geração, de casal são minimizados.
Claro que ele não abarca toda a Tijuca, falta o tijucano conversador e retrógrado; o que sempre encontra os amigos no Tijuca Tênis Clube; os tijucanos da velha geração; os adolescentes e jovens da Praça Varnhagen; os herdeiros da aristocracia tijucana com seus casarões velhos ou mansões no Alto da Boa Vista; ou mesmo os membros da Tijuca profunda, como sugere Aldir Blanc em certo momento, como os freqüentadores dos bares e conhecedores dos segredos e dos ti-ti-tis de botecos tijucanos. Ou seja, ainda podem ser feitos 100 outros filmes sobre o bairro. Mesmo assim, ele resume bem seu principal conflito contemporâneo, Paulo o personagem que ama a região e sabe cada uma de suas histórias e João que tem uma pretensa vida artística, está doido para se mudar e acaba realizando seu sonho de morar no Leblon.
Por mais que sejamos apaixonados pelo bairro, sabemos dos seus problemas, do que ainda falta aqui e o que só vamos encontrar fora do bairro. Esse lado é o do personagem João, que é facilmente (e até… pateticamente) seduzido pela Zona Sul, mas não sem razão, especialmente para quem gosta ou trabalha com cultura. Faltam teatros, centros culturais e cinemas na região. Tanto é que por pouco o próprio filme Praça Saens Pena não passaria na Tijuca, onde só restam os cinemas de shopping. Foi preciso um abaixo-assinado entre outros argumentos para convencer que seria uma boa idéia (financeiramente) exibir um filme sobre o próprio bairro:
Se tivéssemos um Cinema Estação, um Arteplex ou um Cine Santa, esse filme seria um sucesso de público para esse mercado, já que o os tijucanos são 17% do público do Estação. Como o próprio Vinicius (diretor do filme) falou durante o lançamento do livro A Segunda Cinelândia do Rio:
“se alguém abrisse um cinema de arte no bairro ficava rico!”
E é verdade, a Tijuca tem um enorme potencial. Parece que o João se apressou em abandonar o bairro. Temos alguns problemas por aqui, mas não podemos só reclamar e assim que tivermos uma oportunidade sairmos daqui para finalmente “viver a vida”. Reclamar sobre alguns dos problemas é importante sim, mas também exigir melhorias e apresentar soluções! Se fizermos isso, poderemos calar esse lado chorão do bairro, que vive se lamentando sobre o que não temos e que vive querendo se mandar daqui e ao mesmo tempo poderíamos aumentar ainda mais o orgulho de quem ama a Tijuca.
Poderíamos até fazer um Tiju-tour por uma Praça Saens Peña mais arborizada, com os antigos cinemas voltando a exibir filmes, transformados em teatros, casas de shows, centros culturais e no entorno do chafariz com uma vida noturna de dar inveja nos mais “badalados points” da Zona Sul, como diria a Revista Rio Show.
O filme Praça Saens Peña estreia dia 11/12 e sim irá passar no Kinoplex do Shopping Tijuca!
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